16 de julho de 2011

O que celebram os feriados

Olá,

Muitas vezes falei em sala de aula sobre o fato de não existir na cidade de São Paulo uma rua ou avenida com o nome do Presidente Getúlio Vargas.

Se o nome de Getúlio Vargas não foi dado a nenhum logradouro da cidade de SP, o contrário ocorre com ruas e avenidas Nove de Julho. Além de dar nome a uma das principais vias da cidade, também é nome de muitas ruas e avenidas em cidades de todo o Estado. 
Mas isso só acontece no Estado de São Paulo.
Se você for para outros Estados, verá que Getúlio Vargas dá nome a algumas das principais ruas e avenidas de inúmeras cidades brasileiras. Exceto em São Paulo. 

No caderno Eu & Fim de Semana do Jornal Valor Econômico, o colunista carioca Alberto Carlos Almeida, doutor em Ciência Política fala a respeito das datas comemorativas que são celebradas pelos Estados brasileiros e que somente São Paulo comemora um derrota e não uma vitória.


Meu lado paulistano e mooquense se aflorou e discordou fortemente quando o Prof. diz que os paulistas comemoram uma derrota e que essa data comemorativa foi criada pela elite paulista.

Acho que essa data significa
muito para os paulistas. Representa como os paulistas são unidos nas dificuldades e que o pensamento separatista na época não foi motivado somente por fatores que reduziam o papel de São Paulo nas decisões políticas do país, mas principalmente pela ausência de Instituições como o Congresso Nacional, Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais.

Martins, Miragaia, Dráusio, Camargo e Alvarenga não morreram em vão. Nem os bravos voluntários que lutaram nas trincheiras de batalha e os outros tantos que davam apoio a eles. O Teatro Municipal, para quem não sabe, serviu de depósito de munições da tropa paulista.

Os paulistas não venceram, como a história escreve. Mas a vitória não foi essa. Foi a vitória da união de um povo (e não só da elite), que se uniu em busca de um ideal.


Mas essa é uma discussão que é longa e qualquer hora vou falar sobre isso em outro post.

Agora se você quer saber a origem do nome de alguma rua da cidade de São Paulo, é só acessar esse link e colocar o nome:

http://www.dicionarioderuas.com.br/consulta.html
 
Bom, por hora, quero compartilhar com vocês essa visão do Prof. Alberto Carlos Almeida. Pessoalmente não concordo com tudo que ele diz, mas acho interessante compartilhar uma visão diferente da minha, pois escrever somente a respeito do que concordamos é muito fácil. Espero que gostem da leitura e se quiserem comentar, será um prazer saber a opinião de vocês.


Abraços e vamos dando nosso pulos.
MF


O que celebram os feriados

em 15/07/2011
De: Jornal Valor Econômico

Há aproximadamente seis anos me mudei do Rio para São Paulo. Uma das coisas que chama atenção imediatamente são as diferenças e semelhanças nos nomes de ruas. Há tanto no Rio quanto em São Paulo uma rua chamada Mena Barreto.
No Rio ela é muito mais importante do que em São Paulo.
Isso revela alguma coisa quando se tem em mente que legisladores e outros servidores públicos tomaram a decisão de dar os nomes de tais ruas. O mesmo raciocínio se aplica à rua Marquês de São Vicente, que ambas as cidades possuem, mas que no Rio é um endereço nobre que abriga tanto um conhecido shopping de classe média alta como a famosa PUC do Rio de Janeiro.

Um dos nomes de rua que salta aos olhos em São Paulo é Nove de Julho.
Trata-se de uma avenida de grande importância na geografia da cidade. Liga o centro à região da avenida Faria Lima. Essa importância toda contrasta com sua inexistência no Rio.
Há avenidas Nove de Julho em centenas de municípios de São Paulo, todas elas avenidas importantes, mas não há sequer uma avenida Presidente Getulio Vargas, diga-se de passagem, uma das avenidas mais importantes do centro do Rio. Aliás, toda vez que eu estou em uma cidade desconhecida do Brasil e quero, por meio do GPS, ir para o centro da cidade, sempre coloco algum número de uma rua, avenida ou praça Sete de Setembro ou Quinze de Novembro. Nunca dá errado.
Há a alternativa, desde que fora do Estado de São Paulo, de utilizar também o endereço de avenida Presidente Vargas. Em geral também funciona.
Consta que o município de Osasco foi o primeiro de São Paulo a batizar uma rua com o nome do político gaúcho. Não por acaso Osasco é administrada pelo PT.

Está no nome de ruas e avenidas de grande importância não apenas da capital paulista, mas também de inúmeros municípios, o Nove de Julho que também é o feriado estadual de São Paulo. Trata-se de algo muito relevante que a elite política paulista, em 1995, tenha decidido estabelecer a data de 9 de julho como o feriado estadual.
O Nove de Julho é em primeiro lugar a comemoração de uma derrota. Curioso que o feriado estadual paulista comemore uma derrota, ao passo que praticamente todos os outros feriados estaduais no Brasil comemorem vitórias.

Alagoas comemora em 16 de setembro a emancipação em relação a Pernambuco, Sergipe comemora em 8 de julho a emancipação em relação à Bahia, Santa Catarina comemora em 11 de agosto a criação da capitania que separou a região de São Paulo e o Paraná comemora em 19 de dezembro a emancipação em relação ao Estado de São Paulo.

Há muitos Estados que em seus feriados regionais comemoram a criação do próprio Estado. São eles Acre, Amapá, Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Rondônia e Tocantins. São datas que comemoram triunfos políticos, que comemoram, do ponte de vista da elite política local, vitórias.
Somente em São Paulo a data comemorativa local diz respeito a uma derrota.

A data local de Minas Gerais se transformou em um feriado nacional, o 21 de Abril, que, pode-se argumentar, também comemoraria uma derrota. Afinal, os inconfidentes mineiros foram trucidados e o seu movimento não logrou obter a independência do Brasil. Mas a derrota mineira é comemorada como um ideário que depois acabou triunfando. Anos mais tarde o Brasil viria a se tornar independente de Portugal e a Inconfidência teria sido o movimento precursor, o movimento que plantara o ideário que um dia acabou triunfando. Isso fez, inclusive, que o feriado cívico de Minas Gerias coincidisse com o feriado nacional de Tiradentes.

No caso do feriado de 9 de julho, não creio que se trata da comemoração de um ideário que no futuro triunfará. Em primeiro lugar, cumpriria perguntar qual o ideário de Nove de Julho.
A Revolução Constitucionalista ocorreu em 1932 e isso deve servir de aviso àqueles que argumentam que São Paulo lutara contra um ditador gaúcho. Em 1932 era impossível dizer o que aconteceria com Vargas. Os derrotados daquele episódio queriam acima de tudo a volta do predomínio paulista no controle da política nacional. Nada do que aconteceu a Getulio Vargas depois de 1932, Estado Novo, apoio aos nazistas, eleição de Dutra, viabilização da aliança PSD-PTB alijando a UDN do poder, nada disso pode ser colocado na conta dos revolucionários de 1932, simplesmente porque eles não sabiam o que aconteceria no futuro. O que eles sabiam com muita clareza é que Vargas tinha feito uma aliança nacional que retirava poderes de São Paulo e deslocava o eixo da política nacional para outros centros de poder.

O predomínio paulista na política nacional não tinha a ver com a alternância no poder de presidentes de Minas e de São Paulo. Mais do que isso, durante a República Velha, praticamente todos os presidentes passaram pelos bancos da Faculdade de Direito de São Paulo. Nesse sentido, Vargas era realmente de uma elite inteiramente diferente.

A derrota dos constitucionalistas de 1932 foi consolidada pelas novas Constituições brasileiras de 1934 e 1946. Em ambas o Estado de São Paulo perdeu cadeiras na Câmara dos Deputados e se tornou bastante sub-representado (somente em 1890 São Paulo não foi sub-representado na Câmara).
A sub-representação de São Paulo foi exacerbada recentemente pela Carta de 1988. Nunca na história do Brasil São Paulo ficou tão sub-representado na Câmara do que após a Constituição democrática de 1988. O ciclo iniciado por Vargas nos anos 1930 foi fechado por Ulisses Guimarães nos anos 1980.
O Brasil escolheu a atual representação na Câmara dos Deputados como o ponto de equilíbrio federativo do governo nacional.

São Paulo tem hoje 70 deputados federais. Caso a representação na Câmara fosse proporcional ao tamanho do eleitorado do Estado, seriam 120 deputados. Essa é a conta que São Paulo paga para manter a unidade federal. Por outro lado, os dois mandatos de Fernando Henrique e de Lula deixaram claro que o poder nacional passa e sempre passará por São Paulo, não são necessários 120 deputados federais para que isso aconteça. Os dois partidos que disputaram a Presidência da República com chances de vitória, e que continuarão disputando no futuro, são também de São Paulo.

Aliás, foi em 2010 que vimos na TV um fato emblemático pela primeira vez. No dia da eleição, quando as redes de televisão mostram os candidatos indo votar, foi a primeira vez que um dos favoritos, desde 1994, não votava em São Paulo. Dilma votou em Porto Alegre. Tudo indica que na próxima eleição teremos a mesma Dilma votando em Porto Alegre e Aécio em Minas Gerais. Ainda assim, todas as estatísticas de ocupação de ministérios também mostram o predomínio de São Paulo. Trata-se do Estado que emplaca mais ministros e nos postos mais importantes. Até há bem pouco tempo, com Palocci na Casa Civil e Mantega na Fazenda, uma dupla paulista controlava as principais ações do governo.

Quando Vargas assumiu o poder, São Paulo detinha aproximadamente 50% do PIB nacional. Atualmente, essa proporção caiu para em torno de 33%. A centralidade do Estado, todavia, não está no tamanho do PIB, mas em seus aspectos qualitativos: o centro das decisões econômicas, o que inclui o mercado financeiro, a mídia e as principais associações empresariais nacionais, está em São Paulo.

Portanto, ainda que no futuro São Paulo venha a ter menos do que os atuais 33% do PIB nacional, tudo indica que isso ocorrerá caso o Brasil realmente venha a crescer de forma consistente. Os agentes econômicos dos demais Estados precisarão sempre ir a São Paulo para cuidar dos interesses de suas empresas.

A grande questão é que esse recente feriado de 9 de julho, o feriado que comemora a derrota, criado somente em 1995, teve agora uma primeira passeata comemorativa de alguns gatos pingados na avenida Paulista defendendo a separação de São Paulo do Brasil. Não coincidentemente, logo após a eleição de 2010 houve quem, em São Paulo, responsabilizasse o Nordeste pela eleição de Dilma.

Ressentimentos regionais são normais no Brasil e em outros países. Mas a eventual perda de poder relativo não pode servir de motivo para que simples ressentimentos se tornem mais um problema político para o Brasil. É preciso, hoje e sempre, comemorar as vitórias.

Alberto Carlos Almeida, sociólogo e professor universitário, é autor de "A Cabeça do Brasileiro" e "O Dedo na Ferida: Menos Imposto, Mais Consumo".
alberto.almeida@institutoanalise.com
www.twitter.com/albertocalmeida